Jornalismo com seriedade: Estado Islâmico ataca dentro de uma igreja. França ameaça ripostar

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Estado Islâmico ataca dentro de uma igreja. França ameaça ripostar


O presidente François Hollande e o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, ontem, à chegada a Saint-Étienne-du-Rouvray, junto das forças de segurança

Um dos terroristas que degolaram o padre de 84 anos era um francês que tinha pulseira eletrónica por ter tentado ir para a Síria.
O Estado Islâmico voltou a atacar em território francês. Desta vez o alvo foram os católicos. Dois homens armados com facas entraram numa igreja de Saint-Étienne-du-Rouvray, na Normandia, fazendo cinco reféns: o padre de 84 anos foi degolado e três outras pessoas ficaram feridas (uma delas encontra-se em estado crítico). O Papa Francisco, que chega hoje a Cracóvia, na Polónia, para a XXI Jornada Mundial da Juventude, condenou o "homicídio bárbaro" do padre Jacques Hamel e manifestou "dor e horror". Na véspera, as autoridades polacas tinham anunciado a detenção de um iraquiano por posse de explosivos.
Assim que teve conhecimento do ataque à igreja, o presidente francês, François Hollande, deslocou-se ao local, com o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve. "O Daesh declarou-nos guerra e temos de a travar", disse o chefe do Estado francês, exprimindo apoio a todos "os católicos em França". Hollande indicou que iria reunir-se ontem com o bispo da Normandia e hoje com os responsáveis de todos os cultos religiosos. "Temos de permanecer unidos (...) Os terroristas não vão renunciar a nada enquanto não os travarmos. Os franceses não estão sós, há também a Alemanha." Hollande referia-se a uma série de ataques registados em solo alemão no espaço de uma semana, o últimos dos quais no domingo à noite, quando um refugiado sírio que jurou lealdade ao Estado Islâmico se fez explodir num bar da Baviera. "Não viverão em paz enquanto lutarem contra o Estado Islâmico", dizia o sírio num vídeo descoberto no seu telemóvel.
Parece ser isso, precisamente, que está a suceder, com os ataques a passarem para um registo quase diário na Europa. Os dois atacantes de ontem entraram na igreja de Saint-Étienne-du-Rouvray pela porta das traseiras, à hora da missa, 10.00 (09.00 em Lisboa), fazendo cinco reféns: um padre, duas freiras e dois fiéis. Uma das religiosas escapou e foi avisar a polícia. "Obrigaram-no a ajoelhar-se e enquanto tentava defender-se começaram. Não sei se viram que eu saí ou não", contou ao Le Figaro e à rádio RMC a irmã Danielle. Uma hora depois as autoridades abatiam os dois terroristas. Mas não conseguiram salvar todos os reféns. O padre Jacques Hamel, de 84 anos, foi degolado pelos atacantes e uma segunda refém, uma mulher, encontrava-se ontem entre a vida e a morte depois de ter sido também atacada com arma branca.
Nas redes sociais multiplicaram-se ontem as homenagens ao padre natural de Darnétal, ordenado há mais de 50 anos. "Foi ele que me batizou", escrevia uma internauta no Twitter. "Foi ele que batizou um dos meus primos", escrevia uma outra no mesmo fórum. "É um padre coragem para a sua idade", disse o padre Augusto Phuati, a quem Jacques Hamel substituía por aquele se encontrar de férias. "Não entendo. Rezo pela sua família e por toda a comunidade católica. Deu a sua vida pelos outros", disse o imã da mesquita de Saint-Étienne-du-Rouvray, Mohammed Karabila, declarando-se "estupefacto com a morte de um amigo".
Segundo a televisão I-Télé e o jornal suíço Tribune de Genève, um dos terroristas era um jovem francês de 19 anos, que tentou viajar para a Síria em maio de 2015, mas acabou deportado pelas autoridades da Turquia, primeiro para a Suíça e depois para a França. Aí foi processado por associação terrorista, tendo saído da prisão, em regime de liberdade condicional, no passado dia 22 de março (dia dos atentados de Bruxelas). Controlado por pulseira eletrónica, só podia sair entre as 08.30 e as 12.30. A procuradoria tinha recorrido da decisão do juiz no sentido de o retirar de prisão preventiva.
O ataque foi reivindicado pelo Estado Islâmico, através da agência de notícias Amaq. Fonte citada por essa agência classificou os atacantes como "soldados do califado" e apelou aos que queiram "golpear os países cruzados da coligação [que combate o Estado Islâmico na Síria e no Iraque]". O ataque de ontem aconteceu 13 dias depois do de Nice, em França, onde um tunisino atropelou mortalmente 84 pessoas e feriu cerca de 200. Desde janeiro de 2015 a França tem sido alvo de vários atentados terroristas.
Numa reação ao sucedido, o ex-presidente francês e líder de Os Republicanos, Nicolas Sarkozy, pediu que o país riposte. "Nós devemos ser implacáveis. As subtilezas jurídicas e os pretextos para uma ação incompleta não são admissíveis", declarou o líder da oposição, exigindo a François Hollande que ponha em prática "sem demora" as propostas da direita em matéria de contraterrorismo. No Twitter, a líder da Frente Nacional atacou tanto a esquerda como a direita. "A responsabilidade de todos os que nos governam há 30 anos. Vê-los a tagarelar é revoltante!", escreveu Marine Le Pen, que tem pedido a demissão do ministro do Interior, o fecho das fronteiras da França, medidas duras para os imigrantes e suspeitos de terrorismo.