Um
dos terroristas que degolaram o padre de 84 anos era um francês que
tinha pulseira eletrónica por ter tentado ir para a Síria.
O
Estado Islâmico voltou a atacar em território francês. Desta vez o alvo
foram os católicos. Dois homens armados com facas entraram numa igreja
de Saint-Étienne-du-Rouvray, na Normandia, fazendo cinco reféns: o padre
de 84 anos foi degolado e três outras pessoas ficaram feridas (uma
delas encontra-se em estado crítico). O Papa Francisco, que chega hoje a
Cracóvia, na Polónia, para a XXI Jornada Mundial da Juventude, condenou
o "homicídio bárbaro" do padre Jacques Hamel e manifestou "dor e
horror". Na véspera, as autoridades polacas tinham anunciado a detenção
de um iraquiano por posse de explosivos.
Assim
que teve conhecimento do ataque à igreja, o presidente francês,
François Hollande, deslocou-se ao local, com o ministro do Interior,
Bernard Cazeneuve. "O Daesh declarou-nos guerra e temos de a travar",
disse o chefe do Estado francês, exprimindo apoio a todos "os católicos
em França". Hollande indicou que iria reunir-se ontem com o bispo da
Normandia e hoje com os responsáveis de todos os cultos
religiosos. "Temos de permanecer unidos (...) Os terroristas não vão
renunciar a nada enquanto não os travarmos. Os franceses não estão sós,
há também a Alemanha." Hollande referia-se a uma série de ataques
registados em solo alemão no espaço de uma semana, o últimos dos quais
no domingo à noite, quando um refugiado sírio que jurou lealdade ao
Estado Islâmico se fez explodir num bar da Baviera. "Não viverão em paz
enquanto lutarem contra o Estado Islâmico", dizia o sírio num vídeo
descoberto no seu telemóvel.
Parece ser
isso, precisamente, que está a suceder, com os ataques a passarem para
um registo quase diário na Europa. Os dois atacantes de ontem entraram
na igreja de Saint-Étienne-du-Rouvray pela porta das traseiras, à hora
da missa, 10.00 (09.00 em Lisboa), fazendo cinco reféns: um padre, duas
freiras e dois fiéis. Uma das religiosas escapou e foi avisar a polícia.
"Obrigaram-no a ajoelhar-se e enquanto tentava defender-se começaram.
Não sei se viram que eu saí ou não", contou ao Le Figaro e à
rádio RMC a irmã Danielle. Uma hora depois as autoridades abatiam os
dois terroristas. Mas não conseguiram salvar todos os reféns. O padre
Jacques Hamel, de 84 anos, foi degolado pelos atacantes e uma segunda
refém, uma mulher, encontrava-se ontem entre a vida e a morte depois de
ter sido também atacada com arma branca.
Nas
redes sociais multiplicaram-se ontem as homenagens ao padre natural de
Darnétal, ordenado há mais de 50 anos. "Foi ele que me batizou",
escrevia uma internauta no Twitter. "Foi ele que batizou um dos meus
primos", escrevia uma outra no mesmo fórum. "É um padre coragem para a
sua idade", disse o padre Augusto Phuati, a quem Jacques Hamel
substituía por aquele se encontrar de férias. "Não entendo. Rezo pela
sua família e por toda a comunidade católica. Deu a sua vida pelos
outros", disse o imã da mesquita de Saint-Étienne-du-Rouvray, Mohammed
Karabila, declarando-se "estupefacto com a morte de um amigo".
Segundo a televisão I-Télé e o jornal suíço Tribune de Genève,
um dos terroristas era um jovem francês de 19 anos, que tentou viajar
para a Síria em maio de 2015, mas acabou deportado pelas autoridades da
Turquia, primeiro para a Suíça e depois para a França. Aí foi processado
por associação terrorista, tendo saído da prisão, em regime de
liberdade condicional, no passado dia 22 de março (dia dos atentados de
Bruxelas). Controlado por pulseira eletrónica, só podia sair entre as
08.30 e as 12.30. A procuradoria tinha recorrido da decisão do juiz no
sentido de o retirar de prisão preventiva.
O
ataque foi reivindicado pelo Estado Islâmico, através da agência de
notícias Amaq. Fonte citada por essa agência classificou os atacantes
como "soldados do califado" e apelou aos que queiram "golpear os países
cruzados da coligação [que combate o Estado Islâmico na Síria e no
Iraque]". O ataque de ontem aconteceu 13 dias depois do de Nice, em
França, onde um tunisino atropelou mortalmente 84 pessoas e feriu cerca
de 200. Desde janeiro de 2015 a França tem sido alvo de vários atentados
terroristas.
Numa reação ao sucedido, o
ex-presidente francês e líder de Os Republicanos, Nicolas Sarkozy,
pediu que o país riposte. "Nós devemos ser implacáveis. As subtilezas
jurídicas e os pretextos para uma ação incompleta não são admissíveis",
declarou o líder da oposição, exigindo a François Hollande que ponha em
prática "sem demora" as propostas da direita em matéria de
contraterrorismo. No Twitter, a líder da Frente Nacional atacou tanto a
esquerda como a direita. "A responsabilidade de todos os que nos
governam há 30 anos. Vê-los a tagarelar é revoltante!", escreveu Marine
Le Pen, que tem pedido a demissão do ministro do Interior, o fecho das
fronteiras da França, medidas duras para os imigrantes e suspeitos de
terrorismo.