Ex-governadora poderá
ser condenada a devolver R$ 158 milhões aos cofres públicos, além de perder os
direitos políticos por oito anos.
A ex-governadora Roseana Sarney vai
responder a Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa por rombos de mais
de R$ 300 milhões na Secretaria de Estado da Fazenda (SEFAZ).
A denúncia foi apresentada pelo
Promotor de Justiça, titular da Vigésima Sétima Promotoria de Justiça
Especializada, Paulo Roberto Barbosa Ramos, com base em relatórios da
Secretaria de Transparência e Controle e da Secretaria de Estado da Fazenda
(SEFAZ) tratando de auditorias que constataram diversas irregularidades no
Sistema de Arrecadação Tributária (SIAT), que ocorreram entre os anos de 2009 a
2014.
Nesse período, Cláudio José Trinchão
Santos e Akio Valente Wakiyama foram Secretários de Estado da Fazenda do
Maranhão. Segundo o procuradores, tratam-se, notadamente, de compensações de
débitos tributários com créditos de precatórios fantasmas e/ou sem previsão
legal, gerando sérios danos à arrecadação pública do Estado do Maranhão, dentre
outras irregularidades.
Além de Roseana, são acionados também os ex-secretários da
fazenda Cláudio José Trinchão Santos e Akio Valente Wakiyama; os
ex-procuradores geral do estado Marcos Lobo e Helena Haickel, e o ex-procurador
adjunto Ricardo Gama Pestana; o ex-diretor da célula de gestão fiscal da SEFAZ
Raimundo José Rodrigues do Nascimento; o analista de sistemas Edimilson Santos
Ahid Neto; a secretária particular Euda Maria Lacerda e o advogado Jorge Arturo
Mendoza Reque Júnior.
Segundo a denúncia do Ministério
Público Estadual, o grupo promoveu ações no sentido de favorecer empresas em
compensações tributárias indevidas de créditos tributários com créditos
não-tributários com lavagem de dinheiro no valor R$ 307.165.795,49 (trezentos e
sete milhões, cento e sessenta e cinco mil, setecentos e noventa e cinco reais
e quarenta e nove centavos).
“O modus operandi da organização
criminosa envolvia um esquema complexo, revestido de falsa legalidade baseada
em acordos judiciais que reconheciam a possibilidade da compensação de débitos
tributários (ICMS) com créditos não tributários (oriundos de precatórios ou
outro mecanismo que não o recolhimento de tributos). Não bastasse isso, em
diversas ocasiões, foi implantado um filtro para mascarar compensações
realizadas muito acima dos valores decorrentes de acordo homologado
judicialmente”, destaca a ação.
Pedido de condenação de Roseana Sarney
O Procurador pede que a ex-governadora
seja condenada pela prática de Ato de Improbidade Administrativa, artigos 9º,
caput e inciso XI, 10, caput e incisos I, VI, X e XII, 11, caput, todos da Lei
nº 8.429/92, aplicando-lhes as sanções civis cabíveis relacionadas no artigo
12, incisos II ou, na forma do artigo 289 do CPC, requer sucessivamente suas
condenações nas sanções do artigo 12, inciso III da referida Lei de Improbidade
Administrativa, e, especialmente, condená-lo à reparação integral dos danos
causados ao erário, em caráter solidário, incidindo juros e correção sobre o
montante a ser restituído, a saber:
- ressarcimento integral dos danos no
valor de R$ 158.174.871,97
(cento e cinquenta e oito milhões,
cento e setenta e quatro mil, oitocentos e setenta e um reais e noventa e sete
centavos), devidamente acrescido da correção monetária, juros e da multa civil
prevista na norma em comento;
- perda da função pública eventualmente
exercida;
- suspensão dos direitos políticos por
08 (oito) anos;
- pagamento de multa civil no importe
de 02 (duas) vezes o valor dos danos perpetrados ou de até 100 (cem) vezes o
valor da remuneração percebida pelo agente público quando do exercício de seu
cargo, que será destinado ao Fundo Estadual dos Direitos
Difusos;
- proibição de contratar com o Poder
Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou
indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de cinco anos.
O esquema no âmbito da SEFAZ envolvia
Cláudio José Trinchão Santos, Akio Valente Wakiyama, Raimundo José Rodrigues do
Nascimento, Edimilson Santos Ahid Neto, Jorge Arturo Mendoza Reque Júnior e
Euda Maria Lacerda.
Noutra ponta, esse grupo contava com o
decisivo beneplácito de Roseana Sarney Murad, em virtude de ter autorizado
acordos judiciais baseados em pareceres manifestamente ilegais dos
Procuradores-Gerais do Estado por ela nomeados e ainda por ter nomeado para
cargos em comissão 26 (vinte e seis) terceirizados da empresa Linuxell para que
desempenhassem na SEFAZ as mesmas funções para as quais estavam contratados
pela empresa antes referida; e de Marcos Alessandro Coutinho Passos Lobo,
Helena Maria Cavalcanti Haickel e Ricardo Gama Pestana que assinaram pareceres
manifestamente contrários ao disposto no art. 170 do Código Tributário
Nacional, com o único objetivo de desviar dinheiro público, em proveito próprio
ou alheio, valendo-se da condição estratégica do cargo que ocupavam.
É preciso entender agora como o esquema
funcionava e qual o papel que cada um de seus operadores desenvolvia, desde o
chefe maior, no âmbito da SEFAZ, até aqueles que, sob o seu comando, instalaram
um filtro no software da Secretaria de Estado da Fazenda para desviar recursos
provenientes da arrecadação de impostos (ICMS) simulando débitos do Estado sob
o argumento de que se tratavam de precatórios legalmente devidos.
Em seguida, em tópicos específicos
proceder-se-á à individualização das condutas e os atos de improbidade
administrativa nos quais cada um dos integrantes do grupo se encontra incurso,
oportunidade em que serão indicados os documentos nos quais os fatos encontram
sustentação como provas irrefutáveis.
Importa anotar que esse grupo começou a
fincar raízes na SEFAZ com a nomeação de Cláudio José Trinchão Santos para o
cargo de Secretário de Estado dos governos de Roseana Sarney Murad. Registra-se
governos de Roseana Sarney Murad, porquanto Cláudio José Trinchão Santos
permaneceu neste cargo de 17 de abril de 2009 a 02 de abril de2014, quando,
então, se afastou para concorrer ao cargo de Deputado Federal pelo PSD, para o
qual não foi eleito.
Pois bem. Durante as suas gestões,
Cláudio José Trinchão Santos passou a ser auxiliado por cinco personagens
importantes: Akio Valente Wakiyama [01/01/2007 a 08/08/2010 (gestor da
COTEC/SEFAZ); 09/08/2010 a 26/01/2014 (gestor da ASPRO/SEFAZ); 26/01/2011 a
01/04/2014 (Secretário Adjunto/SEFAZ) e de 02/04/2014 a 31/12/2014 (Secretário
de Estado da Fazenda)], Raimundo José Rodrigues do Nascimento [09/08/2010 a
28/05/2014 (gestor da COTEC/SEFAZ0], Edimilson Santos Ahid Neto (01/09/2008 a
13/02/2015), Jorge Arturo Mendoza Reque Júnior, advogado, e Euda Maria Lacerda,
auxiliar deste último.
........................
Mesmo diante do disposto no art. 170 do
Código Tributário Nacional, Roseana Sarney Murad, governadora do Estado, de 17
de abril de 2009 a 31 de dezembro de 2014, celebrou, com a conivência dos então
Procuradores-Gerais Marcos Alessandro Coutinho Passos Lobo e Helena Maria
Cavalcanti Haickel e do então Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Judiciais
Ricardo Gama Pestana, pelo menos, dois acordos judiciais, um com as empresas
DISPEBEL Distribuidora de Bebidas Presidente Ltda., SADIBE Santa Inês
Distribuidora de Bebidas Ltda., DIGAL – Distribuidora de Bebidas Gaspar Ltda. e
MARDISBEL Marreca Distribuidora de Bebidas Ltda. e outro com Mateus
Supermercados S/A e Armazém Mateus S/A, sucessores processuais do Santander S/A
– Serviços Técnicos, Administrativos e de Corretagem de Seguros, incorporador
do Banespa S/A - Administradora de Cartões de Crédito e Serviços, anteriormente
denominado Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo – BADESP.
Cada um desses acordos representou uma
perda para os cofres públicos, da seguinte ordem, respectivamente: a) Grupo DISPEBEL
distribuidora de bebidas presidente Ltda., SADIBE Santa Inês distribuidora de
bebidas Ltda., DIGAL – distribuidora de bebidas Gaspar Ltda. e MARDISBEL
Marreca distribuidora de bebidas Ltda.: 42.694.154,40 (quarenta e dois milhões,
seiscentos e noventa e quatro mil, centro e cinquenta e quatro reais e quarenta
centavos) e b) Grupo Mateus: R$ 49.628.541,16 (quarenta e nove milhões,
seiscentos e vinte e oito mil, quinhentos e quarenta e um reais e dezesseis
centavos) e R$ 104.276.915,41 (cento e quatro milhões, duzentos e setenta e
seis mil, novecentos e quinze reais e quarenta e um centavos), totalizando R$
153.905.456,57 (centro e cinquenta e três milhões, novecentos e cinco mil,
quatrocentos e cinquenta e seis reais e cinquenta e sete centavos).
A soma desses acordos alcançou a não
desprezível cifra de R$ 196.599.610,97 (cento e noventa e seis milhões,
quinhentos e noventa e nove mil, seiscentos e dez reais e noventa e sete
centavos), sem contar valores ainda reivindicados pelo Grupo Mateus, os quais
deixaram de ser pagos a partir de 2015 e que, somados aos já pagos, fazem com
que os valores negociados para atender supostos interesses do Estado do
Maranhão e que, em tese, seriam mais benéficos, ultrapassassem, e muito,
estratosféricos R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais), os quais
poderiam ter sido investidos na construção de escolas de alta qualidade nas
regiões mais pobres do Maranhão, mas serviram apenas para beneficiar dois
grupos empresariais.
Afinal, por que reconhecer que o Estado
do Maranhão devia às empresas antes referidas sem um juízo mais apurado em
todas as instâncias do Poder Judiciário? Por que querer reconhecer dívidas,
mesmo diante da constatação da necessidade de lei especifica, que garantiria a
fiscalização do Poder Legislativo? Por que querer pagar de forma ilegal
precatórios milionários quando estavam sujeitos a ações rescisórias nas quais
houve, lamentavelmente, desistência do Ministério Público Estadual de 2ª
instância?
.......
Cancelamento automático de parcelamento
em atraso
A auditoria da Secretaria de Estado de
Transparência e Controle anotou ainda que o sistema de informação da SEFAZ está
preparado para cancelar automaticamente todos os parcelamentos atrasados por
mais de dois meses, seguindo o regramento estabelecido no art. 80 do RICMS/MA
(Regulamento do ICMS do Maranhão), consoante o qual indeferido o pedido de
parcelamento e não liquidado o crédito tributário, ou deferido o pedido e não
pagas duas parcelas, a repartição fiscal providenciará a inscrição do crédito
tributário remanescente, em dívida ativa, com os devidos acréscimos legais,
sendo de 10 (dez) dias, contados do ciente, o prazo para solvência integral do
crédito tributário, quando do indeferimento do pedido de parcelamento.
Ora, devendo ser assim, após esse
cancelamento automático a única forma de parcelamento é através de intervenção
humana na base de dados do sistema da SEFAZ – SIAT. Essa tipo de intervenção
não possui amparo legal e constitui flagrante burla ao Fisco Estadual, uma vez
que acarretam a suspensão da exigibilidade de créditos tributários e eximem o
contribuinte do efetivo pagamento dos valores por eles devidos. Foi justamente
isso que fizeram Cláudio José Trinchão Santos e Akio Valente Wakiyama.
Importa registar que de acordo com o
art. 80 da Lei Estadual nº 7.799/2002, é dever da repartição fiscal
providenciar a inscrição em dívida ativa de crédito tributário remanescente de
parcelamento não liquidado ou quando não pagas duas das parcelas.
Portanto, um parcelamento continuamente
reativado, sem dúvida, e mais sem a devida contrapartida por parte do
contribuinte, só pode acarretar prejuízos aos cofres públicos, que sofre
injustificável demora para receber o pagamento de crédito tributário devido