Sem o mandato de deputado, Cunha vira ficha-suja e
ficará inelegível a até pelo menos fevereiro de 2027
Brasília
– Após 336 dias de ser alvo de um processo por quebra de decoro parlamentar, o
plenário da Câmara cassou o mandato do deputado afastado e ex-presidente da
Casa Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por 450 votos a favor, 10 contra e nove
abstenções. Intitulando-se responsável por ter coragem de levar adiante o
pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em dezembro passado,
Cunha não resistiu a seu esvaziamento político desde que o Supremo Tribunal
Federal (STF) determinara, de forma inédita em maio, o afastamento do
parlamentar das suas funções sob a acusação de usar o cargo para obstruir
investigações contra ele.
Prestes
a completar 58 anos – no dia 29 de setembro –, Cunha torna-se o primeiro
presidente da Câmara a perder o mandato no comando da Casa quando foi alvo da
representação da Rede e do Psol. As duas legendas acusaram-no de quebrar o
decoro parlamentar ao mentir que não possuía contas secretas na Suíça, durante
depoimento à CPI da Petrobras, em março do ano passado. “Não tenho qualquer
tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu
Imposto de Renda”, disse o peemedebista no colegiado.
Sem
o mandato de deputado, Cunha vira ficha-suja e ficará inelegível a até pelo
menos fevereiro de 2027, quando terá 68 anos. Também perderá direito ao foro
privilegiado e provavelmente parte das investigações contra ele que correm no
STF deverá ser encaminhada ao juiz Sérgio Moro, responsável na primeira
instância na Operação Lava Jato. Moro já investiga a mulher dele, Cláudia Cruz,
e a filha dele Danielle.
Embargo. Após um
processo marcado por manobras regimentais desde a abertura do processo, em
novembro passado, Cunha foi julgado sem sobressaltos. Mesmo em meio às eleições
municipais, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conseguiu garantir
um quórum superior a 400 deputados para votar o processo. Ao todo, 469 dos 513
deputados votaram. A Casa rejeitou na sessão de hoje recursos que tentavam
abrandar a pena ou até suspender a votação final.
A
sessão de votação do processo contra Cunha em plenário durou cerca de quatro
horas e foi marcada por discursos inflamados de parte a parte. O ex-presidente
da Câmara chegou à Casa às 20h45 e preferiu fazer um discurso de cerca de 30
minutos no qual afirmou ter sido vítima de uma retaliação por ter admitido o
impeachment de Dilma.
“É
vingança. Alguém tem alguma dúvida de que, se não fosse a minha atuação, não
teria processo de impeachment? Essa é a bronca do PT e seus assemelhados,
asseclas”, disse ele, ao defender que sua cassação vai servir de “troféu” para
aqueles que defendem que o processo contra a ex-presidente foi um “golpe”.
Mesmo
tendo se queixado nos últimos dias nos bastidores de ter sido abandonado pelo
Palácio do Planalto, Cunha não fez nenhum menção direta ao atual presidente e
aliado, Michel Temer, que assumiu o poder com a queda de Dilma. Insinuou, no
entanto, que foi retirado da presidência da Câmara para não ficar na linha
sucessória do comando do País.
O
peemedebista não poupou críticas à Operação Lava Jato por considerar ter
recebido um “tratamento diferenciado” dos demais parlamentares nas
investigações. E, em tom de ameaça, insinuou que o destino dos mais de 160
deputados que respondem a inquéritos no STF poderia ser igual ao seu. “Amanhã é
contra vocês!”, apontou.
Cunha
embargou a voz em pelo menos três momentos do discurso. Num deles, quando
mencionou que essa poderia ser a última vez que falava da tribuna da Casa. Foi
vaiado durante seu pronunciamento, principalmente por deputados petistas.
Acostumado a ter um séquito de aliados, ele contou com apenas um intransigente
defensor, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), único a apresentar recursos para
tentar, por exemplo, aprovar uma pena mais branda para ele. “Sei que aqui vai
se cometer uma injustiça, mas eu sei que não serei um desses injustos”,
criticou Marun.
Durante
todo o dia, aliados do ex-presidente chegaram a ventilar a ideia de que ele
poderia renunciar ao mandato para tentar adiar a votação. Ele negou as
especulações, mas a intenção