Irregularidades de afilhado de Sarney envolvem mais de R$ 92 milhões
Publicado em 15/01/2012 às 16:53 -
POR OSWALDO VIVIANI (JP)
Auditoria da gestão de Filuca Mendes na Secretaria de Cidades foi
feita pela Controladoria Geral do Estado em 2010; pode ter havido desvios dos
recursos federais destinados a serviços de reparação de danos causados pelas
enchentes de 2009
O relatório final de
uma auditoria feita pela Controladoria Geral do Estado (CGE) na Secretaria
Estadual de Cidades (Secid) em 2010, ao qual o Jornal Pequeno teve acesso,
aponta irregularidades na pasta, então sob o comando do ex-prefeito de
Pinheiro, Filadelfo Mendes Neto, o ‘Filuca’ (PMDB), envolvendo R$ 92,2 milhões
em recursos estaduais e federais. O valor total dos recursos abarcados nas
impropriedades descobertas pela CGE na ‘gestão Filuca’ pode ser bem maior, uma
vez que a auditoria do órgão só analisou procedimentos do período de janeiro a
julho de 2010 (sete meses), e Filuca esteve à frente da Secid de 20 de abril de
2009 a 31 de dezembro de 2010 (20 meses e dez dias).
Indícios de desvios – O
relatório da auditoria da CGE – documento de 39 páginas, assinado por Henrique
Silva Campos (auditor do Estado), Maria Helena de Oliveira Costa (auditora
geral do Estado) e Amância Conceição Pereira (supervisora de Auditoria da área
de Infraestrutura do Estado) – é eminentemente técnico, mas deixa entrever indícios
sérios de que pode ter havido um desvio milionário de dinheiro público na
Secretaria de Cidades, na gestão Filuca Mendes, em particular no que se refere
aos recursos destinados a serviços de reparação de danos causados pelas
enchentes de 2009.
Logo no primeiro
registro do item ‘Resultado dos exames’ do relatório, na página 2, é apontada a
ausência de termos de recebimento em processos que somam mais de R$ 10,2
milhões, referentes a serviços de ‘remoção de escombros, desobstruções de
bueiros e de acessos a ruas e recuperação de ruas, estradas, barragens e
açudes’ em diversos municípios do Maranhão.
O termo de recebimento
é uma exigência legal, e deve ser providenciado por quem concede os recursos.
Sem esse termo, não é possível comprovar que os serviços foram efetivamente
realizados pelo gestor municipal.
Em sua justificativa à
CGE, Filuca Mendes afirmou que a Secid não dispunha de estrutura suficiente
para acompanhar e fiscalizar todos os serviços emergenciais realizados nos
municípios. Sendo assim, em vez de providenciar os termos de recebimento, como
pede a lei, aceitou meras declarações por escrito dos prefeitos, confirmando a
execução dos serviços, que teriam sido executados pelas seguintes empresas:
Bismarck E. Guimarães;
CCG Construções e Terraplanagem; Conscilter Construção Civil; Cruzeiro
Construções, Projetos e Serviços; CTE Construções, Terraplanagem e
Empreendimentos; Ducol Engenharia; Edeconsil Desmatamento e Construções; Enciza
Engenharia; G. Sales Rodrigues Terraplanagem; Guarani Construções; Imperador
Empreendimentos e Construções; Impermanta Engenharia; Liderança Construção;
Maravilha Construtora; Mutante Construções e Comércio; RJM Construções; RC
Carneiro de Carvalho Comércio; TAC Transportes e Construções; e WV Construções
e Serviços.
Também referente a
serviços de reparação de enchentes (‘remoção de escombros, desobstrução de
bueiros e de acessos a ruas’), agora especificamente no município de São João do
Caru, o relatório da CGE afirma, na página 5, que o pagamento de R$ 246,9 mil à
empresa Construções e Comércio Mouta foi feito ‘mediante apresentação de
documento fiscal inidôneo, posto que a Nota Fiscal nº 137, com validade vencida
em 16/11/09, foi emitida em 28/12/09’.
Outro pagamento
irregular por parte da Secid foi registrado pela CGE na página 15 de seu
relatório. A beneficiada foi a empresa Bismarck S. Guimarães, que recebeu, em
junho de 2010, R$ 209,9 mil, por serviços de reparação aos danos resultantes
das enchentes em Coelho Neto, que teriam sido realizados no exercício de 2009.
A Secid incorreu em despesa sem o prévio empenho.
Já nas páginas 26 e 30
do relatório, a CGE afirma que houve ‘ausência de critérios específicos e
determinantes para a definição de valores dos serviços contratados a empresas
(…) para reparação de ruas e estradas, e recuperação de açudes e barragens’ em
mais de 90 municípios maranhenses afetados pelas enchentes de 2009. O total
despendido pela Secid, nesse caso, foi de mais de R$ 38,8 milhões. Para a CGE,
a Secid não comprovou o grau de danos causados pelas cheias sofridos por cada
município, informação necessária para justificar a contratação diferenciada de
serviços às cidades afetadas.
As disparidades são
evidentes: enquanto Trizidela do Vale – cidade onde a cheia de 2009 foi
destaque até no noticiário nacional – recebeu horas máquinas/equipamentos
avaliados em R$ 449,4 mil, o município de Lago da Pedra foi beneficiado com
quase três vezes mais: R$ 1,2 milhão.
Somando-se apenas os
valores envolvidos nos procedimentos da Secid referentes a dinheiro para
reparação dos danos causados pelas enchentes, nos quais a CGE encontrou
irregularidades, chega-se ao total de mais de R$ 49,5 milhões.
Mais irregularidades –
A auditoria da CGE também detectou irregularidades (ausência de motivação
adequada e de estudo de quantidade) em licitações da Secid no valor de mais de
R$ 1 milhão para fornecimento de passagens aéreas, combustível e locação de
veículos.
Igualmente foram
identificadas impropriedades em pagamentos à Construtora Targino Construções
(R$ 44,8 mil) e em convênio firmado com o Instituto Ana Pinheiro Cruz (R$ 983,7
mil), referentes à construções de casas populares em Zé Doca e Pinheiro,
respectivamente.
O pagamento à Targino
foi feito pela Secid sem a apresentação, por parte da construtora, da devida
planilha de medição dos serviços contratados.
No caso do convênio com
o Instituto Ana Pinheiro Cruz – uma OSCIP (organização da sociedade civil de
interesse público) que, segundo a CGE, não tem registro nem no conselho
nacional nem no estadual de Assistência Social –, a Controladoria apurou
ausência do projeto básico e de informações referentes à localização dos
imóveis e às pessoas beneficiadas.
Governo do estado – Em
contato telefônico com o JP, na manhã de ontem (14), o secretário Sérgio Macêdo
(Comunicação) afirmou que os relatórios finais de auditorias da CGE não são
encaminhados ao Executivo estadual, e sim aos secretários auditados, para que
providenciem a regularização dos procedimentos questionados. ‘O relatório da
CGE não significa uma condenação’, disse Macêdo.
MPF
pediu à PF investigação contra ‘Filuca’ em agosto de 2011
Em ofício datado de 18
de agosto do ano passado, o procurador da República José Milton Nogueira Júnior
solicitou ao superintendente da Polícia Federal do Maranhão, Cristiano Barbosa
Sampaio, a instauração de um inquérito policial para investigar um suposto
desvio de recursos do Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica) por
parte do ex-prefeito de Pinheiro, Filuca Mendes (PMDB), no ano de 2006.
De acordo com o ofício,
Filuca juntou, em sua prestação de contas de 2006, vários processos de
pagamentos de ‘abono do Fundeb’ e ‘serviços extras realizados’ a professores
municipais, o que não teria ocorrido na prática.
Além da instauração de
inquérito policial para elucidar os fatos e suas circunstâncias, o MPF
solicitou que fosse enviado ofício ao Tribunal de Contas do Estado (TCE),
pedindo informações sobre as contas do município de Pinheiro referentes ao
exercício de 2006, apenas no tocante à verba do Fundeb, e o encaminhamento,
ainda, de toda a documentação correlata, como relatórios de informações
técnicas, vistorias, notas fiscais, processos licitatórios, recibos e ordens
bancárias.
O procurador José
Milton requisitou também à PF que enviasse ofício ao Tribunal de Contas da
União (TCU) solicitando informações sobre a fiscalização do Fundeb/Fundeb no
município, com objetivo de averiguar o uso dos recursos envolvidos, abordando a
execução física e financeira dos projetos, inclusive a eventual prática de
saques, do tipo ‘na boca do caixa’, sem a utilização de cheque nominal, ordem
bancária ou outro meio que identifique o destinatário da verba.
O procurador solicitou
ainda que a PF pedisse ao Ministério da Educação e ao Banco do Brasil, outras
informações. No caso deste último, extratos e demais documentos bancários da
conta do Fundeb/Fundeb.
A PF já está em posse
de toda a documentação pedida e o inquérito está em andamento.